quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Nicotina como droga!

Quantos fumantes têm consciência que o cigarro é nocivo?
Além disso, quantos sabem que a nicotina é uma droga potentíssima?
Certamente poucos. E há motivos para se desconfiar dessa abordagem. É possível comprar cigarro em padarias, bancas de jornal, restaurantes, supermercados, enfim, nos mais diversos estabelecimentos. A venda e o consumo são lícitos e usar o tabaco e seus derivados não é um caso de polícia.
Foi esse o choque de realidade que o casal Vicente de Paula Casonato, de 54 anos, e Fátima Vieira Casonato, de 49, teve ao começar o tratamento no ambulatório antitabagismo Prev Fumo, ligado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), que funciona dentro do Lar Escola São Francisco, na Capital.

"Lá, conhecemos um lado do cigarro que nem imaginávamos. Não víamos como uma droga," comenta Casonato. Para sua mulher, além do baque ao perceber que era dependente química, ela aprendeu que não era fraca, mas que o fumo é mesmo perigoso.
A nicotina vicia rapidamente e de maneira crônica. Seu consumo leva à produção de dopamina no cérebro, que traz a sensação de prazer. Por isso, as pessoas fumam várias vezes ao dia.
Para o coordenador do Prev Fumo, Sérgio Ricardo de Almeida Santos, a nicotina é quase perfeita do ponto de vista da droga. Ela vicia sem ter uma dose letal, que cause overdose "Só que mata aos poucos, porque vai causando doenças crônicas que vão minando o organismo até que a pessoa desenvolva uma patologia aguda e fatal, como infarto, derrame cerebral. A nicotina traz prazer suficiente para que a pessoa continue fumando, mas matando de forma imperceptível."
No organismo, o local que tem maior concentração de receptores para nicotina está em uma área do cérebro conhecida como o centro do prazer. Por isso que, mesmo com o gosto nada saboroso e o mau cheiro, o fumante gosta tanto do cigarro. Não há nada mais prazeroso para um fumante do que dar umas tragadas. E por isso parece ser tão difícil parar.
Parar de fumar interfere no humor das pessoas ou no grau de ansiedade e depressão. O acompanhamento com profissionais qualificados é importante para dar suporte ao paciente. A diretora do Núcleo Antitabagismo do Instituto do Coração (Incor), do Hospital
das Clínicas de São Paulo, Jaqueline Scholz Issa, indica o tratamento para todas as pessoas que já tentaram parar de fumar e não conseguiram, ou que apresentem uma doença e ainda assim não querem deixar o vício. "Essas situações demonstram que a pessoa tem um alto grau de dependência à nicotina e certamente vai precisar buscar ajuda", afirma Jaqueline.

Essa lição Fátima Casonato aprendeu na prática. "Antes de procurar um grupo de tratamento fiz coisas completamente erradas. O que torna mais difícil conseguir largar o vício," comenta. Ela chegou a ficar trancada três dias no apartamento ao lado do seu e pediu para os filhos só mandarem comida pela janela. "As chaves ficavam com eles. Para o apartamento levei apenas um colchão e uma televisão. Sofri bastante, chorava muito, e o
meu marido vendo isso ficava com dó e jogava uns três cigarros por debaixo da porta. Conclusão: sofri e não consegui parar de fumar," conta.
A última atitude desesperada que tomou antes de procurar tratamento adequado foi percorrer a cidade de ônibus. "O único lugar que não fumo é dentro de ônibus. Então, entrava em um e descia no ponto final. Logo, subia em outro. E assim foi um dia inteiro. Perdi a noção de quantas horas fiquei rodando. Só sei que não consegui ficar sem fumar. No fim, peguei bituca no meio da rua e fumei".

Toda tentativa de parar de fumar deve vir precedida de uma decisão e um desejo. Se a pessoa não está interessada e busca o tratamento apenas porque foi indicado por um médico ou por insistência da família, é feito um trabalho de motivação para que ela tenha determinação.
Depois, é necessário marcar a data do primeiro dia sem fumar. Na véspera, é importante se livrar de todos os objetos que lembrem o tabaco. Jogar fora cinzeiros, isqueiros e maços de cigarro. "Isso é fundamental para que o indivíduo comece a construir no seu inconsciente a figura de uma nova pessoa, um não-fumante, com um comportamento diferente," explica Santos, do Prev Fumo.
Alguns sintomas da síndrome de abstinência sempre surgem quando um paciente tenta abandonar uma droga. Esses podem ser minimizados com ações simples. A primeira delas é ocupar a boca. O fumante faz isso o dia inteiro. A orientação é que a pessoa beba líquido
diversas vezes em pequenas quantidades e masque chicletes ou balas. Praticar atividades físicas também é importante, pois ajuda a produzir um conjunto de substâncias chamadas endorfinas, que aliviam a ansiedade. Além disso, atividade física aumenta o gasto de energia, o que reduz o risco de ganho de peso quando deixa de fumar.
Durante o acompanhamento profissional também são ensinadas estratégias para se evitar recaídas. É importante que o paciente reconheça os fatores de risco, situações que significam grande vontade de fumar, como momentos de estresse agudo, ociosidade, tomar um cafezinho. Outra coisa é evitar bebidas alcoólicas, porque o álcool reduz o juízo crítico.