sexta-feira, 16 de outubro de 2009

NICOTINA - COGNIÇÃO E MEMÓRIA

O sistema colinérgico exerce substancial papel na cognição, e a ruptura da
neurotransmissão colinérgica no cérebro por efeito farmacológico ou por causa
neurodegenerativa provoca marcada piora da função cognitiva. Há evidência que a
nicotina, seja como droga isolada ou através do tabaco, exerce aumento do desempenho cognitivo, particularmente, com respeito ao processamento da informação.

A nicotina possui poderoso efeito psicoativo. Com a injeção subcutânea de solução
salina contendo apenas 0,8mg de nicotina, verifica-se o desencadeamento rápido de resposta, afetando diretamente o processo de cognição e atenção. Isso ocorre em humanos não-fumantes.

Injeções de nicotina em macacos jovens melhoram a memória para a execução de várias tarefas; assim como, em animais roedores, ela favorece a performance nos testes de memorização. No complexo mecanismo pelo qual a nicotina atua sobre o desempenho cognitivo, o sistema de receptores colinérgicos tem importante papel. Recentemente, experiência com neurônios do hipocampo do cérebro de ratos em cultura de tecidos, sobre os quais se aplicou nicotina, verificou-se resposta intersináptica, sugerindo que essa droga aumenta a liberação da neurotransmissão nesses neurônios. Os autores dessa pesquisa sugerem que esse processo reforça a idéia de que o hipocampo seja um centro de aprendizado da memória e levantam a hipótese de que a nicotina no tabaco poderia influenciar por esse a cognição e memória nos fumantes.

O valor do modelo animal para análise das propriedades farmacológicas da nicotina, relacionados com a função cognitiva, é o de aprofundar o conhecimento do seu mecanismo em doenças neuropatológicas como Parkinson e Alzheimer. Entretanto, sua transposição para investigações no homem tem sido desapontadora sob diversos ângulos. O cérebro deste é muito mais complexo que o do rato. No homem, o desempenho cognitivo e a memória envolvem inter-relações de muito maior número de estruturas cerebrais. Por outro lado, é extremamente diverso o modo como se analisa a farmacodinâmica da nicotina nas experiências com animais e no homem. É muito diferente o efeito da nicotina em animais de experimentação, porque é administrada controladamente por tempo limitado, do que sua ação prolongada crônica com repetição centenas de vezes diariamente e por muitos anos. Os receptores nicotínicos diminuem suas respostas ou dessensibilizam-se e os efeitos cognitivos, eventualmente vantajosos decorrentes de uma ou algumas doses de nicotina, desaparecem com a ação crônica por decênios no fumante. Nas próprias pesquisas em ratos, macacos e outros animais, o teor das doses de nicotina ou sua repetição continuada dessensibiliza os receptores nicotínicos, eleva-se a sua tolerância e as respostas variam amplamente, enfraquecem. Altas doses de nicotina suprimem a liberação de acetilcolina; a repetição crônica deprime a sua produção. Devido a isso, recomenda-se que nas investigações experimentais usem-se doses adequadas, mantendo intervalos de tempo suficiente entre cada administração da droga.

É, portanto, totalmente diversa a ação farmacológica da nicotina administrada em
dosagens adequadas e em condições controladas de experimentação, do que a maneira incontrolada repetidamente usada pelo fumante centenas de vezes por dia e por anos a fio. Os graves efeitos deletérios da nicotina pela forma que é usada nos fumantes, sufocam totalmente em qualidade e quantidade, de forma dramática, as escassas propriedades farmacológicas favoráveis que ela possa conter. Ao contrário do que sucede com a liberação e produção de dopamina por ação da nicotina produzindo estímulos experimentalmente manipulados, seu uso crônico incontrolado pelo tabagista altera o “turnover” daquela, com repercussão negativa para o desempenho cognitivo. Recentemente, estudo sobre o assunto comprovou que o consumo crônico de tabaco provoca prejuízos significantes na performance cognitiva. Idosos com 60 ou mais anos, tabagistas por longos
anos, revelaram anormalidades na função cognitiva em 11,95% a mais – odd ratio 2.33 – em comparação com os que jamais fumaram. Prejuízos semelhantes verificaram-se com o consumo de álcool.

Prejuízos na função cognitiva provocados pelo tabaco também se constatam em
jovens. Estudantes tabagistas, confrontados com não-fumantes, gastam muito mais horas na revisão de dados antes dos exames do que estes últimos, e a demora está vinculada à quantidade de cigarros fumados. Há boas revisões sobre o assunto na literatura, mostrando que algumas conclusões em contrário resultam de fatores de confusão. O erro mais comum é comparar fumantes com outros que se abstiveram de fumar durante muitas horas. É evidente que nestes últimos surgem prejuízos no desempenho mental pela abstinência tabágica, porque são nicotino-dependentes. Uma dose de nicotina, satisfazendo a dependência, restabelece a sensação euforizante e o bem estar influindo no desempenho cognitivo. Isso é bem destacado nos adolescentes. Nestes, porque o cérebro está em desenvolvimento, os centros nervosos são mais sensíveis à nicotina. Esta exerce rápida alteração nos sistemas adrenérgicos e dopaminérgicos e outras alterações nervosas.Há, em decorrência, repercussões maiores na cognição e comportamento.

Pelo exposto, infere-se que interpretar as respostas farmacológicas obtidas no
laboratório por experiências controladas como sendo benéficas aos tabagistas,
incentivando-os a continuar fumando, é ignorância científica ou interesse de iludir com informação enganosa como procede a indústria tabaqueira.

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